quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

O Mito do Bodó (Peixe Acari)


O Acari, também chamado de cascudo ou Bodó, é um peixe muito conhecido na região amazônica e em parte do nordeste. No Paganismo Piaga, Bodó faz parte da linha de entidades encantadas das águas, conhecidas como Caruanas. Uma antiga lenda indígena nos conta um pouco sobre sua origem mitológica.

Houve um tempo em que os bichos falavam. Nesse tempo o peixe Bodó nadava tranquilo pelo Rio Surubiú, de Alenquer (PA). Era um peixe com escamas brilhosas e brancas, com um brilho tão especial que alguns o conheciam como "peixe prata".

Muito charmoso, o Bodó adorava exibir-se para os outros animais, muitos deles chegaram um dar queixas à Mãe d'água e ao Deus Tupã, pelas arrogâncias que o peixe fazia.

A arraia, que sempre ficava encostada ao barro, no fundo do Rio Amazonas, foi uma primeira a queixar-se, pois o Bodó sempre passava ao seu lado e, com desprezo, dizia:

- Pobre arraia, vive a comer barro e se torna tão suja que nem pode exibir suas pintas de sarna.

Após caçoar da arraia, saía dando risadas irônicas.
Outra queixa foi dada pelo camarão, pois o Bodó passava por ele e puxava suas barbas.
O tracajá, calmamente nadava pelo Rio Surubiú, quando então o acari passava e, com sua calda, chicoteava a carapaça do tracajá.

-Pobre tracajá. Eu com escamas belas brancas e brilhantes como pérolas e este bicho com casco duro, preto e feio.

Assim resmungava o peixe, por onde passava, zombando da aparência dos demais animais.

Depois de tantas queixas dos animais aos Deuses, o Bodó foi chamado e levou umas broncas. Tupã falou ao Bodó:

-  Seu nome é Acari, que significa peixe bonito. Por que, com tanta beleza, você fica ofendendo seus amigos? Isso não pode continuar! A partir de hoje você será, observado pelo bem-te-vi, não quero ouvir nenhuma queixa sobre você, caso isso aconteça, tudo para você se tornará contrário e até seu nome mudará! Agora vá, seja obediente e amigo de todos, não se esqueça do que te orientei.

Tupã também deu ao Bodó uma cumbuca, alertando o mesmo:
- Tome essa cumbuca, mas você não poderá abri-la de forma alguma. Como castigo pela sua arrogância terá a missão de levar essa cumbuca até a casa do Boto Juvenal, que, mora no Igarapé de Alenquer!

Com as barbatanas baixas, o Bodó saiu nadando pelos rios. Passou pelo Rio Gurupatuba (Monte Alegre), pelo Rio Tapajós (Santarém) e pelo Lago Grande (Curuá). Quando resolveu descansar um pouco, encontrou uma cobra grande que disse:
- Pobre bicho. Está cansado?
- Sim, estou em uma missão,
- Missão? Mas que missão?

O peixe se explicou, mas a traiçoeira e curiosa cobra o questionava:
- Você está levando esta cumbuca e nem sabe o que tem dentro? E se ela explode e queima suas escamas brilhantes, você ficará feio e será apelidado de todos os seres dos rios, será motivo de risadas.

A cobra saiu, mas deixou o Bodó pensativo.
O peixe olhou para um lado e outro, mas quando olhou para cima viu que estava sendo observado pelo bem-te-vi.
Então ele foi para o fundo e se escondeu na lama dos barrancos das terras caída, onde o bem-te-vi não poderia vê-lo.

No fundo do Rio Amazonas, ele abriu a cumbuca e, com um estouro, foi surpreendido com a fruta murici, que estava presa na cumbuca. 

O ar preso levantou o peixe curioso com uma força tão grande que caiu ele caiu de costas, em cima do tracajá, e como castigo suas escamas brilhantes viraram casca preta. 

A polpa do murici o lambuzou todo, por isso que ele tem hoje, umas pintas amareladas. Durante a transformação nasceram barbas, como um castigo pelo peixe ter tratado mal o camarão.
Como as sementes do murici se espalharam dentro as matas, em vários cantos foram nascendo pés de muricizeiro.

Até hoje o pobre peixe se esconde feito a arraia, em meio ao barro no fundo dos rios. Dizem que ele não quer que o vejam, pois tem vergonha do que fazia. Mas quando os outros peixes passam por ele, sempre o chamam, não mais de Acari, mas pelos nomes de "Cascudo" ou "Bodó", porque vive sujo de barro.

O mito de Acari nos ensina sobre humildade e respeito; nos mostra que todos possuem qualidades e que nunca devemos agir de forma arrogante, subestimando e humilhando as pessoas, pois o mundo dá voltas e, nessas voltas, podemos sofrer as transformações para o bem ou para o mal, dependendo de nossas atitudes.

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