quarta-feira, 1 de junho de 2022

A Bruxa de Évora no Culto Piaga

Não se sabe exatamente como o culto da Bruxa de Évora chegou ao Piauí, o que se sabe é que atualmente ela é uma figura bastante conhecida entre praticantes de magia de todo o Brasil. Como uma boa bruxa, ela costuma ser bem eclética e se manifesta em diferentes contextos religiosos: no catimbó, na umbanda, no terecô e, claro, no piaganismo.

Bruxa de Évora
Ilustração: Rafael Nolêto
Conhecida também como “Lagarrona” ou "a Moura Torta", ela é uma figura enigmática, especialmente pela falta de registros confiáveis sobre sua existência. Pela falta desses registros, a Bruxa de Évora não pode ser considerada uma figura histórica, mas não deixa de ser uma bruxa mitológica cuja magia permanece viva na memória e nos cultos que atravessam séculos.

Segundo a escritora Maria Helena Farelli, a Bruxa de Évora teria vivido em Portugal, na época em que reinou o primeiro monarca português, Dom Afonso Henriques, que nasceu em 1109 e morreu em 1185.

Évora é uma referência à cidade de mesmo nome, local onde a bruxa viveu e praticou suas artes mágicas. Este nome possui origem etimológica proveniente do celta antigo “ebora” ou “ebura”, formas plurais do termo “eburos”, que significa teixo. Eburra, então, seria uma referência aos bosques de teixos existentes naquela região. Há também quem defenda que o termo Évora deriva do árabe يعبره (yueabiruh), que significa “atravessar” ou ليعبر (liuebur), que significa “cruzar”.

Uma das principais menções à Bruxa de Évora ocorre no famoso Livro de São Cipriano, onde é relatado o encontro que o velho feiticeiro teve com a bruxa moura. Se formos considerar o relato ao pé da letra, chegaremos à conclusão que está repleto de inconsistências históricas, pois Cipriano viveu entre os primeiros cristãos e Portugal surgiu como nação muito tempo depois, por volta de 1093. 

Particularmente, acredito que este encontro não ocorreu na época e no local relatado na maior parte dos livros de São Cipriano, mas sim em alguma região do Oriente Médio, provavelmente na Babilônia, berço de muitos ocultistas. Sob essa perspectiva, considero que Cipriano possa realmente ter encontrada a “Bruxa de Évora”, mas na Babilônia, em meados do Século III, talvez nos anos 200 da Era Comum. 

Sendo uma contemporânea do bruxo Cipriano, faz mais sentido que o nome Évora derive do árabe e esteja ligado às passagens e encruzilhadas, locais de grande poder mágico. Na época em que Cipriano viveu, Évora ainda era uma cidade sob o domínio romano, chamada Ebora Liberalitas Julia, cuja conquista ocorreu em 57 d. E. C. 

Ao avaliarmos essas possibilidades, podemos especular que tanto a Bruxa de Évora como o Bruxo Cipriano foram personagens que existiram numa mesma época, mas cujos relatos migraram e – ao longo dos séculos – se mesclaram, sendo influenciados pela memória dos povos que os difundiram pela Península Ibérica. 

Deixando as teorias e especulações históricas à parte, prosseguimos considerando que a Bruxa de Évora manifesta sua energia entre os praticantes da feitiçaria, em diversos segmentos, e isso é o que nos basta pra ter fé nesta poderosa e misteriosa entidade.

Considerada a grande sábia, conselheira, poderosa e temida figura feminina de sua cidade, a Bruxa de Évora era conhecedora das magias e segredos do oriente médio, aquela que dominava como ninguém a magia árabe, a cartomancia, a oniromancia e as incontáveis rezas que utilizava para os mais variados fins. Falava três idiomas - o árabe, o latim e o português - e dizem que ela (em sua versão portuguesa) utilizava até mesmo o alcorão de forma mágica. Seus animais de poder são o gato preto, a coruja e a cabra preta, que lhe faziam companhia.


No Brasil, a Bruxa de Évora se manifesta até hoje, através de médiuns que a incorporam. Quando essa entidade se acosta, traz seus conhecimentos para auxiliar em casos de amor, desmanchar feitiçarias, quebrar maldições, trazer prosperidade, abrir os caminhos e tantas outras causas.

É uma das entidades mais poderosas e versáteis dentro das práticas de feitiçaria piaga, se manifestando geralmente como uma velha sábia, às vezes dando gargalhadas que se arrastam pelo ar, mas sendo sempre bastante assertiva e respeitada. 

Como oferendas, a Bruxa de Évora recebe vinho tinto, vodka, cachaça, frutas, chás, café, charuto, fumo de rolo, cachimbo, penas, chifres, moedas e artefatos mágicos. Aqui reproduzo o selo que é utilizado para evoca-la, na tradição piaga. Pode ser gravado em pedra, madeira ou metal. No chão, pode ser riscado com giz e devem ser colocadas sete velas roxas acesas, sendo uma em cada ponta do triângulo maior, e uma em cada Tridígito (“pé de galinha”).


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